quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Crendices de dias, meses, anos e números

Há dias fastos e nefastos. A existência deles se deve em parte à religião oficial. Nos dias de guarda e festa religiosa, não se deve trabalhar, são nefastos para quem deseja ter saúde, fortuna, felicidade. O domingo é um dia fasto para quem o guarda, o observa, porém, nefasto para aqueles que não o guardam. 

"Trabalho de dia de domingo não vai para frente". Quando uma cousa é começada, não é terminada e durante o transcorrer dos trabalhos nela empregados não há sucesso, logo dizem: "isso é trabalho de domingo".

Joca Machado, barreou sua casa nova lá na rua do Socorro num domingo. Passados alguns meses, o barro havia caído todo... Manuel Dores observou: "tá vendo, isso é trabalho de domingo, não vai pra frente".

Outra recomendação para não se iniciar serviço algum é-nos dada através deste provérbio rimado:

Quando mingua a lua
não comece coisa alguma.


As fases da lua têm grande influência na vida agrícola, de guarda. Afirmam que antigamente nem feira havia. "Já se foi o tempo que na Sexta-Feira da Paixão, havia tanto respeito que os homens de bem da cidade, iam à igreja de luto fechado, só o tiravam no sábado depois da aleluia", suspirou o velho Pedro de Castro, narrando cousas do passado de sua terra natal. No Dia da Hora ou da Ascensão é comum encontrarmos nas casas ramos verdes – é a simpatia para que as moscas mudem para a casa dos amancebados. Há outro pedido que deve ser feito em jejum, em qualquer sexta-feira pela manhã:

Moscas malvadas,
da sexta pro sábado
estejam mudadas.


Coincide com os dias das feiras na comunidade a data da mudança das moscas incômodas que aborrecem os moradores.

Não percebemos a existência de mês aziago além de agosto. "Mês de agosto não presta pra fazê negócio". "Eu evito trabalhá nas matas no mês de agosto", disse o velho Anísio Jacaré, "eu não sei porque é, mas não gosto".

"Meis bom e feliz é o de São João e de Santana" (junho e julho), dizem várias pessoas da cidade, unindo a estas referências o fato das festas das fogueiras. O mês do São João é muito alegre na comunidade. Em três dias distintos há festas: Santo Antônio, São João e São Pedro. Com a festa de Santana (26 de julho) encerram-se as festas cíclicas do solstício do inverno, as festas das fogueiras.

"Quando eu era mais moço", disse Porfírio, "o meis que eu mais gostava era o de São João, eu festava o que dava".

É provável que o fato das festas, da alegria reinante por ocasião do solstício de inverno, lhes condicione uma apreciação favorável ao mês nos quais elas se realizam.

O mês de agosto é também deixado de lado para os casamentos, "não presta casá em agosto, morre logo um"; "não presta casá em agosto, a gente nunca é feliz, tudo dá pra trás na casa". "Não presta também casar-se na Quaresma".

Dos anos, só o bissexto é perigoso. Alguns dos acontecimentos de triste memória acontecidos na comunidade, quando relembrados, passaram-se num ano bissexto, ou relacionam com ele.

Mané das Dores, o maior conhecedor de adivinhas, de parlendas, de lendas, verdadeiro almanaque vivo da população, ao se referir aos meses veio com esta parlenda e depois fez uma conta nas juntas dos dedos com os ossos do metacarpo para elucidar melhor o que procurou ensinar:

De trinta dias é setembro;
abril, junho e novembro;
fevereiro vintoito dias tem
sendo bissexto mais um lhe dêm,
e os mais mês sete são
trinta-um dias todos terão.


O número 13 é o único portador de azar. O 7 é número de mentiroso. Há um parlenda infantil que ensina a contar, e o número "3 foi o Cão quem fez". O Cão é o diabo. Aliás, tal parlenda existe no estado de São Paulo: "um, dois, três foi o diabo quem fez". A variante de Piaçabuçu é: "um, dois, feijão com arroz; três, quatro, feijão no prato; cinco, seis... foi o Cão quem fez". Acreditamos que não signifique número de azar, porém, um rima fácil apenas, auxiliadora da memorização.

Os jogadores acreditam que este ou aquele número seja de sorte ou de azar, e como o jogo é bastante disseminado, há as mais variadas prevenções contra os números e cartas do baralho.

Disse um informante, "eu gosto muito do barrufo ou do francês, mas quando jogo os dados a primeira vez e cai a soma três, já sei que esse dia estou com o azar trepado no cangote, mas si dá o cinco, eu sei, tá prá mim, desforro".

Fonte: Medicina rústica - Alceu Maynard Araújo

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