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As Amazonas segundo Ulrico Schmidl |
Uma expedição comandada por Gonzalo Pizarro, irmão do conquistador do Peru Francisco Pizarro, saiu de Quito no Natal de 1541, com o objetivo de atravessar os Andes em busca do "País da Canela", uma terra situada do outro lado da muralha dos Andes, na selva oriental, onde se supunha que as árvores de onde se podia extrair a valiosa especiaria cresciam em quantidade. Não as encontraram, em quantidade comercialmente útil e decidiram descer o rio Napo (no atual Equador) em busca de outras possíveis riquezas.
Depois de descerem 300 quilômetros, exausto e faminto, Gonzalo Pizarro mandou, um de seus comandados, Francisco de Orellana, buscar provisões à frente de um grupo. Porém, Orellana não voltou e depois de seis meses, Pizarro, julgando que fora traído ou que Orellana fora morto, regressou a Quito com os demais sobreviventes.
Frei Gaspar de Carvajal, que acompanhou Francisco de Orellana nessa aventura, relata-nos o sucedido. A expedição desceu o rio Napo, mas sua corrente era forte demais e em apenas um dia de viagem, teriam percorrido 120 quilômetros. Sem poder retornar, Orellana foi forçado a seguir em frente. Algumas semanas depois, no dia 11 de fevereiro de 1542, atravessou a foz do Rio Napo e alcançou um rio muito maior. Ali, os índios irimaraés lhe perguntaram se iam "visitar o território das ‘grandes senhoras’ (coniupuiara, em nheengatu), pois, se o fizessem, se acautelassem porque elas eram muito numerosas e que os matariam".
Em outra aldeia, teram contrado uma praça com uma grande escultura em relevo, onde figurava, sob dois leões, uma cidade murada com altíssimas torres. Tendo Orellana perguntado sobre o seu significado, teria sido informado de que os habitantes eram súditos e tributários das amazonas, a quem forneciam penas de pássaros.
Frei Carvajal descreveu inúmeros outros encontros e acidentes, mas o mais notável se deu em 24 de junho de 1542, dia de São João, quando a expedição deteve-se perto da foz do rio Nhamundá (perto da atual divisa entre Amazonas e Pará) para festejar o santo. De novo tiveram de enfrentar uma tribo hostil. Orellana tentou o entendimento, mas os aborígenes afirmaram "que nos apanhariam a todos para nos levarem às mulheres guerreiras". Os espanhóis responderam com o fogo das armas, a luta intensificou-se e o próprio Carvajal foi ferido. Surgem então as ditas mulheres com arcos e flechas em socorro da tribo.
"Elas lutavam com tal ardor que os índios não ousavam recuar e se algum fugia à nossa frente eram elas quem os matavam à paulada (...) São muito alvas e altas, com cabelo muito comprido, entrelaçado e enrolado na cabeça. São muito membrudas e andam nuas a pêlo, tapadas em suas vergonhas; com os seus arcos e flechas na mão, fazem tanta guerra como dez índios (...) Em verdade houve uma dessas mulheres que meteu um palmo de flecha por um dos bergantins, e as outras, um pouco menos, de modo que os nossos bergantins pareciam porcos-espinhos."
Segundo Carvajal, um índio aprisionado no combate disse que aquelas mulheres viviam a sete jornadas da margem e que, como o seu senhor Couynco estava a elas subordinado, vieram ajudá-lo. O indígena conhecia suas terras, aonde já fora levando-lhes o tributo em nome de Couynco. Disse que viviam em casas de pedra com portas, agrupadas em 70 aldeias cercadas, pelas quais ninguém passava sem pagar tributo.
Coabitavam com índios que capturavam em guerras que empreendiam apenas para esse propósito. Ao engravidar, mandavam embora esses homens sem lhes fazer mal. Os filhos homens eram sacrificados ou enviados aos pais e as meninas, treinadas para a guerra. Sua rainha se chamava Coñorí e em suas terras havia grandes riquezas de ouro e prata e cinco templos dedicados ao Sol, chamados caranaí, com assoalhos e tetos pintados, além de inúmeros ídolos femininos de ouro e prata.
Andavam com roupas finíssimas, fabricadas com a lã das "ovelhas peruanas" (alpacas): "seu trajar é formado por umas mantas apertadas dos peitos para baixo, o busto descoberto, e um como manto, atado adiante por uns cordões. Trazem o cabelo solto até o chão e postas na cabeça coroas de ouro, da largura de dois dedos". Sua terra é povoada por camelos (lhamas) que servem de animais de carga e havia dois lagos de água salgada. Ao anoitecer, todos os homens deviam retirar-se de suas cidades.
Apesar do encantamento do dominicano com as guerreiras nuas, o contato lhe custou caro. Segundo ele próprio, “Nosso Senhor achou adequado que uma flecha atingisse um dos meus olhos, de modo que o atravessasse de um lado a outro” e perdeu o olho esquerdo. Em 26 de agosto de 1542, Orellana e seus soldados finalmente viram o mar e rumaram para o norte ao longo da costa. Alguns dias depois, ancoraram em Cubagua, pequena ilha na Venezuela e puderam contar ao mundo sua história, devido à qual o grande rio ficou conhecido como "rio das amazonas", hoje rio Amazonas.
Em 1576, Pêro de Magalhães Gândavo chamava "rio das amazonas" ao grande rio, comprovando a divulgação do mito no Brasil. E acrescentou: "Algumas índias há também entre eles que determinam ser castas as quais não conhecem homem algum de nenhuma qualidade, nem o consentirão, ainda que por isso as matem. Estas deixam todo o exército de mulheres e imitam os homens e seguem seus ofícios como se não fossem fêmeas, trazem os cabelos cortados da mesma maneira que os machos fazem, e vão à guerra com os seus arcos e flechas e à caça perseverando sempre na companhia de homens e cada uma tem mulher que a serve com quem diz que é casada, e assim se comunicam e conversam como marido e mulher."
Fonte: Fantastipédia.